DEBÊNTURES

Alguém virá
Roçar suas mãos
Em sagaz leveza
Antes de terminar o dia…
Instalado sem qualquer algaravia
Aquele momento em que certas flores dormem
Respirando o doce perfume que mesmo exalam
Sem exigência de exemplar promessa
 

Esse alguém
Não te cobrarás nada
Nada mais exigirá que estar em conjunto
além do teu respiro
E suspiro muito
Olhando a mesma planície distante
O mesmo semblante dos dias sem pretensão
Qual ação encerrada por si mesma
 

Nunca o espere
Ele virá sem aviso prévio
Quando estiveres distraída
Bem fundo: de tudo, e do mundo,
E dos boletos no quadro de rolha
Enfim, baterás à tua porta
Sentar-se-á à tua mesa
Experimentará os vegetais de tua horta
 

Nada de caução, outra palavra estranha
Qual a cura de teus vícios redibitórios
Ele picotará outras promessas promissórias
Não há fundo de garantia
Que dê espeque à criação da alegria
Que emerge de um ato fortuito
A força maior, o menor mal
Não previstos nos anéis de qualquer Câmara
(ou Tribunal)
 

Até para dívidas que corroem o peito
Haver-se-á de construir um jeito…
Alguém virá pra te lembrar algo escondido:
A arte do esquecimento
E nada te cobrará por tuas culpas
Ajudar-te-á na limpeza de teus olhos
Esgotados de tanta poeira, incerteza, lágrimas
Essas cristalizadas à beira do caminho…
 

Sabe essa tal felicidade?
Ah, não se corre atrás dela
Distraída se espera
Ou não se espera
Paciência: essa ciência esmera
Esfera circulada pelo tempo
Desenhando sem pressa o caminho palpável
E te mostrando a visão do inexorável…

      Bergson Guimarães (BH, 25, 07,
2024), do livro, ainda inédito,
MORRENDO E APRENDENDO